“Atrevo-me a denominar a concepção de Demétrio Ribeiro como ‘arquitetura da vida’”, destacou a vereadora, que conviveu com o arquiteto na Câmara em seu primeiro mandato (1983-1988).
Lembrando a frase de Tolstoi (Conhece a tua aldeia e serás universal), Jussara Cony lembrou: “é, pois, desse conhecimento de sua aldeia que, para mim, o professor se torna universal. Pois quem conhece, cuida; quem cuida, preserva e dinamiza. Demétrio foi uma pessoa impregnada de amor por sua profissão, por seu país, por seu trabalho, pela vida, em sua dimensão revolucionária”.
Jussara também lembrou da cassação do arquiteto em 1964, quando era docente da UFRGS. Demétrio era membro do Partido Comunista desde 1945 e somente pôde ter seus direitos readquiridos em 1979, com a Anistia. Durante a ditadura, Ribeiro teve importante atuação na luta pela redemocratização por meio do IAB. Em 2004, Demétrio Ribeiro recebeu o título de Cidadão Emérito pela Câmara de Porto Alegre, por iniciativa do então vereador Raul Carrion.
A vereadora também destacou: “Ao longo de sua vida, dedicada à arquitetura, Demétrio o fez com a consciência profissional e política de homens e mulheres que sempre acreditaram que para a arquitetura – assim como para as demais profissões – se reservam significados superiores. A construção do ‘habitat humano’, para um revolucionário como o nosso querido professor de tantas causas, é uma manifestação coletiva onde, historicamente, convivem os conflitos, as desigualdades e a miséria. Quem sabe, a melhor homenagem que possamos fazer a esse homem seja a do compromisso histórico com uma reforma urbana democrática e participativa, impulsionadora do fim das desigualdades”.
O papel do Estado e da arquitetura
Rafael Passos, vice-presidente do IAB RS, citou trechos de discursos proferidos por Demétrio Ribeiro no 10º e 12º Congresso Brasileiro de Arquitetos, realizados respectivamente em 1979 – em Brasília – e em 1985 – em Belo Horizonte.
“O Estado que, seja qual for sua composição social de classe, é responsável perante a nação por suas obrigações históricas para com o futuro do país, omite-se diante do problema do habitat brasileiro, ignorando as necessidades humanas das massas populares e transferindo responsabilidades que lhes são inerentes ao setor empresarial privado. O significado da tecnologia nacional é desconhecido e subordinado aos interesses do capital estrangeiro. O que nos cabe, como profissionais e cidadãos, é lutar pelo direito que nos assiste, como trabalhadores intelectuais que somos, de participar efetivamente da vida nacional”, citou Passos.
E continuou, recordando Ribeiro: “Vista politicamente, a socialização da ideia de arquitetura contém, necessariamente, a exigência de melhores condições de vida coletiva, sendo, portanto, fator potencial de consciência reivindicativa. Arquitetura é o direito ao conforto e à dignidade da casa e da cidade”.
Em outro momento, Ribeiro também rechaçou a visão elitista e supérflua que se tem da arquitetura: “Essa desinformação oficializada prejudica, sobretudo, a cultura do povo, perpetuando preconceitos tecnicistas e escamoteando a responsabilidade social, econômica e cultural de quem projeta e organiza o espaço”.
Por fim, ao abordar o reconhecimento de Ribeiro ao IAB na luta por outra arquitetura, Rafael Passos colocou que, além dos próprios profissionais da área, “hão de congregarem-se outros segmentos da sociedade, cada vez mais reconhecedores da importância da arquitetura e do urbanismo para a qualidade de vida e para o desenvolvimento das cidades com justiça social, para que não sejam vistas prioritariamente como suporte de desenvolvimento econômico, mas como bem coletivo e base material de uma vida digna para seus cidadãos e cidadãs”.