IAB RS promoveu o debate “novembro negro e as políticas afirmativas para a arquitetura e urbanismo”

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O evento reuniu profissionais da arquitetura que falaram sobre suas trajetórias pessoais e a importância das cotas raciais, bem como a permanência de pessoas pretas nas universidades e no mercado de trabalho.

O IAB RS, com o apoio da Direção Nacional, promoveu, no dia 26 de novembro, o debate “Novembro Negro e as Políticas Afirmativas para a Arquitetura e Urbanismo”, no Solar do IAB, e contou com a presença dos arquitetos e urbanistas Carlos Eduardo Iponema Costa, Gustavo de Castro Pires, Nathália Gomes e Sherlen Borges, com mediação da arquiteta e urbanista e integrante da Comissão de Ações Afirmativas do CAU/BR, Martina Lersch. Além de ressaltarem suas trajetórias pessoais, os convidados destacaram a importância das cotas raciais, implantadas no Brasil há 12 anos, e fizeram um balanço dos impactos dessa lei, com foco nos cursos de arquitetura, no mercado de trabalho e nas instituições de classe.

Nathália Gomes abriu as falas destacando as políticas afirmativas, especialmente a lei de cotas, que surgiu a partir de um movimento chamado Reparação Já. “Ele surgiu em 1993, um momento em que as manifestações estavam se intensificando. Mais de 3,6 milhões de africanos foram trazidos ao Brasil, gerando, em quase 400 anos, uma força de trabalho escravizada, envolvendo, pelo menos, 31 milhões de pessoas. É importante sempre repetir esses dados para que se perceba o porquê do uso do termo reparação. A reparação vem no sentido de rever a desigualdade, e proteger determinados grupos historicamente silenciados”, disse.

Em 1997, com a discussão cada vez mais aprofundada sobre o tema, apenas 4% das pessoas pretas frequentavam ou haviam concluído o ensino superior no Brasil, e uma série de movimentos surgiram para tentar reverter esse cenário. “No começo dos anos 2000, a cada 100 universitários, apenas 2 eram negros. Em 2003, uma legislação estadual do Rio de Janeiro passou a considerar cotas na rede pública de universidades. Surge, então, um movimento negro unificado, que parte dessas manifestações”, relata.

Somente em 2012 seria sancionada a Lei 12.711, que garante a reserva de 50% das matrículas em cursos de universidades federais e institutos federais de educação do país aos alunos que estudaram no ensino médio público, em cursos regulares ou da educação de jovens e adultos. “Nessa época eu estava no ensino médio, e entrei em uma instituição privada por meio do FIES, mas meus colegas que estão aqui ingressaram depois na universidade já por meio dessa lei, e agora estão sendo profissionais”, conta.

Sherlen Borges, formada em 2020 e conselheira do CAU/RS, relembra que ingressou na faculdade em 2013, um ano após a implementação da lei de cotas. “É importante falar isso pela importância da lei e todos os profissionais que foram formados por meio dela durante os últimos anos”. Outro dado que a arquiteta trouxe foram sobre as políticas afirmativas em cotas para pessoas trans, cadeirantes e indígenas. “Em 2021 houve uma redução de vagas para pessoas trans. Havia 485 vagas no ano anterior, e passou para 124. São dados da revista Gênero e Número. Universidade é um projeto de resistência, luta e identificação. A Universidade é um espaço nosso. Eu acho que é importante trazer esse relato, porque hoje a gente também não vê muitos colegas indígenas na arquitetura, por exemplo, agora nós temos três professores indígenas. Muita coisa ainda é uma luta, desde 2012”, enfatiza.

Formado em 2008, o arquiteto Carlos Eduardo Iponema Costa, também conselheiro do CAU/RS, ressaltou o orgulho em falar sobre políticas afirmativas. “Eu fui o único. O único estudante negro na escola, o único estudante da faculdade de arquitetura da PUC numa época em que não haviam cotas, o único arquiteto negro concursado da secretaria de obras, o único conselheiro negro. Mas costumo dizer que, no CAU, se não tivesse lideranças comigo, muita coisa não teria acontecido”, disse, relembrando a criação do comitê de ações afirmativas, como era chamado na época, incluindo as questões raciais. “Hoje para mim é um orgulho imenso estar aqui, palestrando, com outros colegas, porque deixei de ser o único”, comemora.

Ao longo de sua fala, Costa destacou toas as ações afirmativas do comitê (do qual é coordenador na atual gestão, que inclui Sherlen na composição de profissionais), não apenas envolvendo raça, mas também LGBTQIAP+ e sobre etarismo. Contextualizando o mercado no Estado, entre quase 19 mil profissionais registrados, 64,9% são mulheres. “Além de lutar por questões raciais, também luto pelas questões das mulheres, então que bom que temos essa maioria”, ressalta. O profissional enfatizou a importância do envolvimento de todas as comissões do CAU/RS no planejamento de ações. “Precisamos inclusive estarmos alinhados com a gerência de comunicação. Uma das nossas lutas atuais é deliberar com o CAU BR um projeto para que sejam incluídas no código de ética as capitulações que falam sobre penalidades no caso de qualquer tipo de preconceito e assédio cometido por outro arquiteto. No momento não há”, disse.

Por fim, o arquiteto Gustavo de Castro Pires falou sobre suas perspectivas acerca da profissão e dos seus caminhos, bem como o fruto de diversas ações que foram realizadas nos últimos anos. “Presenciei diversas questões sobre violência na comunidade onde cresci, as dificuldades, e depois de me formar no ensino médio fiquei pensando no que fazer. Com muita luta cheguei na área da arquitetura, campo que sempre me tocou, por ter interesse no urbanismo e nas políticas habitacionais”, relembra. Ainda na faculdade, a criação do coletivo Uanda auxiliou a potencializar a resistência diante da pressão que sofriam com atos racistas. “A gente tem uma estrutura acadêmica na arquitetura de elite, e tivemos então uma mudança nesse perfil. Nos consolidamos como coletivo”, falou. Após a formatura continuou participando de diversas ações afirmativas, ampliando o espaço ocupado por pessoas pretas.

Assista ao debate na íntegra clicando aqui.

 

A co-presidente do IAB RS Jéssica Neves, com o Caderno de Políticas Públicas do CAU/BR em mãos, Shrerlen Borges, Martina Lersh, Nathália Gomes, Gustavo de Castro Pires e Carlos Eduardo Iponema Costa.

Conheça mais sobre os participantes:

Nathália Gomes: Arquiteta e urbanista com especialização em Gestão Estratégica do Território Urbano (UNISINOS, 2023) e mestrado em Planejamento Urbano e Regional pela UFRGS (2024), focado na produção urbana de quilombos em Porto Alegre. Conselheira no CAU/RS e no IAB RS; professora de Arquitetura e Urbanismo na Ulbra e pesquisadora dos laboratórios Margem e Encruzilhada. Atua em temas como territórios quilombolas, lutas urbanas, práticas insurgentes, espaços públicos e paisagem urbana.

 Sherlen Borges: Arquiteta e Urbanista graduada pela UFRGS (2020). Mestre (2023) e doutoranda em Planejamento Urbano e Regional pela mesma instituição. Teve dissertação defendida com título: “Evidências de Racismo Institucional em um bairro negro: o caso do bairro Bom Jesus em Porto Alegre/RS”. Atualmente atua profissionalmente como pesquisadora na área do Planejamento Urbano com ênfase em questões sociais, raciais e na luta por moradia, através da assistência técnica. Faz parte do Coletivo de Arquitetura Popular Mãos. Terra. Território; é membro fundadora do laboratório de pesquisa Encruzilhada, que discute a temática de raça e cidade e é Conselheira do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU/RS). Também é arquiteta militante, atuando no movimento União Nacional por Moradia Popular/RS. Tem interesses nas áreas de planejamento urbano e raça, plano diretor participativo, planejamento territorial, interseccionalidades, primeira infância, bairros amigáveis a primeira infância, lideranças comunitárias negras, quilombos urbanos, ocupações, direito à cidade e direito a terra.

Carlos Eduardo Iponema Costa: Arquiteto e urbanista formado em 2008; Mestre em Avaliação em Impactos ambientais; especialista em engenharia e arquitetura hospitalar; arquiteto concursado da Secretaria de Obras Públicas do RS; professor universitário da FTEC – Porto Alegre; conselheiro estadual titular do CAU/RS (gestão 2021/2003 e 20204/2026); coordenador da Comissão de Políticas Afirmativas (CTPAF) e coordenador adjunto da Comissão de Ética e Disciplina (CED).

Gustavo de Castro Pires: Homem Negro, Pai, Arquiteto e Urbanista – UFRGS; sócio proprietário do escritório Castro Arquitetura; membro fundador da Associação Ubuntu Ukama Viamão; membro fundador do Coletivo Uanda – Coletivo de Estudantes Negros da FAUD/UFGRS; mestrando no Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional – PROPUR/UFGRS; idealizador do Estúdio Uanda; integrante da equipe técnica de Coordenação de Projetos e Execução do Museu do Hip Hop do Rio Grande do Sul.

IAB - RS

Por: Diretoria Instituto de Arquitetos do Brasil - IAB

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