Porto Alegre, Legado Negado

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A cidade, desde a chegada dos pioneiros casais, tem nas águas do Guaíba e no porto os símbolos fundamentais do seu imaginário social. Hoje vê negado seu direito de decidir sobre as transformações na orla e seu porto.

O ano de 2014 marcou o centenário do Plano Geral de Melhoramentos, que colocou a capital entre as primeiras cidades brasileiras a pensar seu desenvolvimento urbano. Em 1914, o Intendente José Montaury viu na iniciativa do Governo do Estado de construir um porto moderno capaz de escoar a produção agropecuária gaúcha a oportunidade de realizar um plano geral que integrasse aquele projeto a uma estratégia abrangente de modernização inspirada pelo projeto político positivista.

O país vivia a República Velha. A democracia era restrita a homens brancos alfabetizados. Inexistente era a estrutura técnico-administrativa do munícipio. O planejamento urbano e o urbanismo eram ciências em germinação no Brasil e no mundo. Naquele contexto, Montaury convocou um grupo de "notáveis" cidadãos a compor uma comissão presidida pelo Engenheiro João Moreira Maciel.

Nos últimos cem anos, atravessado por violentas ditaduras, a democracia brasileira se ampliou incluiu mulheres, negros, analfabetos, e novos espaços de participação. O planejamento urbano e o urbanismo se desenvolveram como técnica e ciência. O município consolidou as condições técnico-administrativas para propor seu desenvolvimento urbano.

As administrações do período de redemocratização criaram novos espaços de gestão compartilhada da coisa pública. O Orçamento Participativo, e o Forum Social Mundial, promoveram a cidade a um notável alcance internacional. Em 1999, após anos de um amplo processo de participação, o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental antecipou instrumentos que viriam a integrar o Estatuto da Cidade, de 2001, marco legal da política urbana no país.

Todo este legado parece estar sendo negado. Projetos de grande impacto como o da Orla, do Pontal do Estaleiro, do Cais Mauá, e do Metrô seguem às escuras, sem participação e sem um planejamento articulado a um projeto de cidade. Soma-se ainda as condições de desmonte do sistema de planejamento urbano.

Esta é a realidade atual de Porto Alegre ou, pelo menos, é o que a falta de transparência nos permite perceber. Planejamento urbano de qualidade com ampla participação é o que sua sociedade e sua história exigem.


Rafael Passos é vice-presidente do IAB RS
IAB - RS

Por: Diretoria Instituto de Arquitetos do Brasil - IAB

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