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TORCENDO PELO BRASIL

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Apita o árbitro. Começa a Copa do Mundo. Estamos todos torcendo para o Brasil, para que jogue bem e que ganhe a Copa. Estamos torcendo, mas não queremos ganhar de qualquer jeito, não queremos depender apenas da sorte ou da ajuda do juiz, do corpo mole dos adversários ou de mudanças de regras no meio do jogo… Futebol é assim: ganhar de 1×0 jogando bem e fazendo um gol de placa é muito diferente de ganhar de 1×0 com gol de canela, impedido, com as calças na mão e a torcida vaiando… Entretanto, o fato de nosso time não jogar bem, nunca foi motivo para trocar de time. Pelo contrário, é motivo para participar mais, exigir mais empenho e dedicação dos dirigentes, treinador e jogadores, ir para o campo apoiar o time para que ele se recupere e não siga perdendo. Ambas vitórias valem os 3 pontos, mas será que é só isto que está em jogo nesta Copa?

Metaforicamente, esta é exatamente a nossa posição – como profissionais e como entidade – com relação à Copa do Mundo no Brasil e ao seu dito legado. Com a aproximação dos jogos parece haver uma exigência para que todos – pessoas e entidades – se posicionem “contra” ou “a favor” da Copa. Esta simplificação esconde a verdadeira discussão que exige uma postura mais inteligente e construtiva. É claro que, enquanto brasileiros, somos a favor da Copa do Mundo no Brasil. Por outro lado, também é fato que o IAB e os arquitetos e urbanistas não podem estar a favor de todas as indecências que estão sendo feitas, em nome da Copa, pela Fifa e por alguns governos e empresas.

Nas sociedades capitalistas e globalizadas, a realização dos grandes eventos é uma convergência de oportunidades econômicas que favorecem a concentração de investimentos financeiros para a realização de uma grande quantidade de obras sobre um mesmo território em um período de tempo relativamente curto. Este fenômeno é bastante criticado, mas também pode produzir efeitos benéficos para a cidade e sua população, dependendo de como são determinados e controlados os seus processos. Obviamente, se o interesse público está, na hierarquia de decisões, acima dos interesses privados a probabilidade de bons resultados é muito maior. Por exemplo, os novos estádios construídos para a Copa são obras maravilhosas, uma goleada de arquitetura de qualidade, mas consolidam uma bola na trave que é a elitização dos estádios a partir da “shoppinização” e do aumento dos preços dos ingressos que tem excluído o povão das arquibancadas. E tem também, muito gol contra: superfaturamento de obras, promiscuidade nos financiamentos públicos, falta de contrapartidas urbanas para os entornos dos estádios, remoções de população para obras viárias exageradas que, invariavelmente, seguem privilegiando o automóvel privado…

FOI A COPA QUE TROUXE ESTAS “NOVIDADES”?

Neste sentido, propomos uma reflexão: estas indecências que estão sendo feitas em nome da Copa são novidades ou apenas estamos assistindo uma concentração e potencialização do modo de fazer impregnado em nossa cultura política e econômica? No Brasil, os superfaturamentos são uma prática corrente nas grandes obras de engenharia e infraestrutura ou apenas agora, na Copa, está sendo assim? A Copa é que está impondo a prioridade para as faraônicas obras viárias sobre os direitos à moradia e sobre as áreas verdes? Alguma vez em nossa história construir e melhorar escolas e hospitais foi realmente uma prioridade sobre as obras de asfalto e viadutos?
Raras vezes o poder público tem conseguido atuar em nome do interesse comum e da maioria da população. Em geral, os interesses de grupos econômicos poderosos se apropriam das esferas públicas administrativas para colocá-las ao seu serviço, fenômeno conhecido como “privatização do Estado”. Porque na Copa seria diferente?

Pênalti!

Em nosso entendimento, a Copa apenas está escancarando a forma como tratamos nossas cidades e as obras públicas: descaso com o planejamento; cultura do improviso e do jeitinho; burocracia absurda; obras contratadas sem projeto completo, mal detalhadas e orçadas; falta de concursos públicos; irresponsabilidade dos administradores; falta de participação da população… Enfim, o “modo de fazer” das obras da Copa não nos oferece grandes novidades como legado.

Os jogadores ainda nem entraram em campo e o espetáculo que estamos assistindo é uma oportunidade na qual o Brasil não jogou nada bem. Está claro que repetimos erros históricos e já conhecidos. Agora nos resta torcer e, se o Brasil não for campeão, pelo menos que o campeão seja o time que jogar melhor, mostrar mais qualidade em campo, encantar pela eficiência e beleza de seu jogo. Como se diz “que vença o melhor”. De qualquer maneira, o futuro campeão do mundo de futebol não depende de nós e da nossa vontade e não podemos influir nem um pouco neste resultado.

Por outro lado, de nada adianta ficarmos apenas torcendo pelas cidades brasileiras, precisamos entrar em campo porque este jogo está sendo jogado e estamos perdendo de goleada. Estamos na terceira divisão deste campeonato e o resultado disto não é apenas uma tristeza momentânea pela derrota de nosso time, é muito mais grave, porque afeta diariamente nossa qualidade de vida. Se temos a pretensão de um dia sermos campeões, teremos que escolher muito melhor nossos cartolas e treinadores, fazer com que as regras do jogo sejam cumpridas por todos e, certamente, entrar em campo e alterar a tática de jogo completamente.

QUAL O LEGADO, AFINAL?

Nossa responsabilidade, enquanto profissionais e como entidade, é aproveitar a Copa para tentar fazer com que seu verdadeiro legado seja um ensinamento para nós e para toda a população. Este ensinamento passa principalmente por esclarecer à todos a importância do planejamento e dos bons projetos urbanos e arquitetônicos.

Na nossa posição, de arquitetos e urbanistas do IAB, é isto que estamos procurando fazer quando criamos o Conselho de Arquitetura e Urbanismo; quando lutamos por mais Concursos Públicos para obras públicas; quando defendemos projetos completos detalhados nas licitações públicas; quando exigimos transparência e participação; quando promovemos a dimensão cultural da arquitetura na sociedade; quando criamos uma lei que garante às famílias de baixa renda o acesso ao trabalho do arquiteto; quando insistimos que o planejamento e um bom projeto é o melhor caminho para a verdadeira solução de um problema e para a construção de uma cidade mais justa e sustentável.

Que o legado desta Copa seja a lição de que sem planejamento e sem bons projetos não há solução para nossas cidades. Esta é a posição dos arquitetos e urbanistas, estamos em campo para qualificar as cidades e seguimos torcendo pelo Brasil.

Diretoria do IAB RS
Abril de 2014

IAB - RS

Por: Diretoria Instituto de Arquitetos do Brasil - IAB

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