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Violência Urbana por Décio Rigatti

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Como uma contribuição ao debate do tema proposto para este encontro, gostaria de trazer algumas reflexões para dividir com os palestrantes e com o público. Serei bastante breve e sucinto, para deixar um tempo maior aos convidados e à discussão, naturalmente tentando dar o viés da minha formação como arquiteto. Sem dúvida, um dos temas mais constantes no debate sobre a cidade é a violência urbana e o medo como impulsionadora das medidas voltadas à mitigação da sensação de insegurança. Dado divulgado no início de setembro dá conta que, em todo o Brasil, atualmente o efetivo que atua na segurança privada supera em mais do que 50% o efetivo ocupado na segurança pública, somados o pessoal ocupado na Polícia Civil e na Polícia Militar. O custo da corrupção no Brasil retira de áreas estratégicas e de possibilidades de programas sociais que amenizem os efeitos da desregulamentação da economia um volume de dinheiro vergonhoso e indecente, que é apropriado privadamente. Esta talvez seja uma das grandes violências sociais, com impacto desastroso para o conjunto da sociedade. Paralelamente a esta verdadeira obsessão sobre a violência e a insegurança, sentida na carne ou tida como sensação, é interessante observarmos como a disciplina arquitetônica responde a esses estímulos, reais ou não, da ameaça percebida no convívio com o outro. Apenas para resgatar alguns aspectos que me parecem fundamentais para este debate citaria a dificuldade crescente de se estabelecerem relações com a diferença, principalmente no atual período da acumulação capitalista, diferentemente do que tendia a ocorrer no período anterior. O filósofo inglês Zygmut Bauman define esse período anterior como modernidade sólida, no sentido de que as relações de trabalho, de produção e de proteção social eram palpáveis e com regras consolidadas que permitiam certo controle do futuro individual e coletivo. O mesmo autor define o atual período como modernidade líquida, significando que se troca a palpabilidade, a permanência e os produtos por relações etéreas, desregulamentadas, sem regras que assegurem a segurança da manutenção de um status quo , seja individual ou coletivo, seja no hoje ou no vir a ser. Na sociedade sólida, mesmo o chamado exército de reserva para o funcionamento do sistema, os que se encontravam temporariamente marginalizados do mundo econômico – e social – se encontravam assim num sentido de provisoriedade. No período atual, um imenso exército de marginalizados – no sentido estrito de “à margem” – o estão de modo inexoravelmente permanente, sem perspectivas objetivas de reverter o que Bauman denomina de “supérfluos”. A não ser com a ação do Estado, esse contingente tem pouca ou nenhuma condição de sobrevivência. Estes aspectos, que podemos chamar de estruturais, são percebidos localmente, ou seja, afetam a vida cotidiana de cada um e de todos, mas a partir de efeitos globais ou de globalização já que são efeitos que se alastram para qualquer país do mundo. A própria Margareth Tatcher, ex-primeira ministra britânica e grande arquiteta da modernidade líquida – juntamente com Ronald Reagan, ex-presidente americano – admitia em seus discursos que a sociedade não tinha como atender ou considerar um mínimo de 30% da população, que estava permanentemente fora da produção e dos benefícios da modernidade e que o Estado já não podia mais arcar com o custo de manutenção dessa massa de supérfluos, razão pela qual o Estado de Bem Estar Social do mundo desenvolvido começou a se desmanchar como um castelo de gelo no deserto. Essa massa de marginalizados passa a se constituir num perigo para o outro, principalmente no perigo de tornar a ser um deles que passam a ser percebidos no território da cidade como os pedintes, os sem-teto, ou simplesmente os vagabundos da rua. E qual a resposta que localmente é dada pela disciplina arquitetônica para reduzir este “perigo”? A separação espacial, a segregação, a convivência com iguais e a retirada do outro. As áreas de condomínios, materialização da eliminação da diferença prosperam, se ampliam e, no caso de Porto Alegre, comprometem inclusive as poucas áreas de expansão urbana ainda existentes. No entanto, se o setor imobiliário explora ad nauseum a paranóia da insegurança como estratégia de marketing para vender seus empreendimentos, o mesmo discurso não pode ser admitido pelo poder público, de todos, por definição. A negligência, o estímulo, a negociata e a mediocridade tem sido a tônica de um processo perverso que, ao nível local, reforça um mecanismo de tendência global para a segregação e a intolerância, a partir das políticas públicas de ocupação do espaço urbano. Não nos esqueçamos que o espaço urbano é construído a partir de processos sociais, mas com autorização pública. Portanto, a administração municipal, tanto o Executivo quanto o Legislativo, nunca foi nem nunca será isenta de responsabilidades pelos processos em curso como nunca foi nem nunca será neutra nas suas decisões. A perversidade do resultado em termos de segregação sócio-espacial só é páreo para a perversidade da canalização de recursos públicos, ou seja, de todos, na consolidação da não cidade, isto é, do espaço que não admite a diferença nem a presença do outro, nem ao menos a visibilidade dessas diferenças. Temos que entender que, se é aceitável que, frente a um mercado para o espaço urbano esquizofrênico, este modelo seja explorado pelo setor imobiliário, não é possível admitir que este processo de fragmentação e desestruturação da vida da cidade seja de qualquer modo estimulado, incentivado, apoiado e, muitas vezes, bancado pelo dinheiro de todos, a partir das políticas públicas medíocres que acompanhamos em nossa cidade. Políticas públicas sobre o território da cidade não podem entrar na corrente do que o mercado decide fazer com a cidade. Se quiserem fazer condomínios, se determinadas categorias sociais escolherem viver no isolamento e na homogeneidade, que façam, que se isolem, mas não com o apoio do setor público que devia estar mais ocupado em reestabelecer o princípio da convivência para todos e, não impedir, mas cobrar muito caro pelas ações que hoje são responsáveis pela insustentabilidade econômica e social de nossa cidade.

Por: Diretoria Instituto de Arquitetos do Brasil - IAB

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